sexta-feira, 4 de abril de 2014

Sobre a visita de Valter Vinagre à Oficina de Jornalismo e Fotografia do "Há Festa no Campo"


Apontamento, 3 abril 2014

Hoje, na oficina de jornalismo e fotografia do Jornal das Aldeias, promovido pelo projeto "Há Festa no Campo", tivemos o privilégio de poder contar com a presença de Valter Vinagre. Conheci o trabalho do Valter (a partir de hoje trato-o por tu, exigência dele) através da coleção "Um Diário da República" do coletivo Kameraphoto, onde publicou o foto-livro "Barra das Almas". O Valter fotografa com as suas entranhas (palavras dele) e tem um aperto de mão forte (palavras minhas), daqueles que nos lembram que os corpos também são terra e tempo e, sobretudo, memória. Paisagens. "Se abríssemos as pessoas, encontraríamos paisagens" disse Agnés Varda. E tudo isto se sente nas imagens que ele (o Valter) fabrica. No tempo que passou connosco o Valter foi de uma abertura calorosa e acutilante, comovente até. Ao fim de poucos minutos parecia que nos conhecíamos há anos, muitos anos - penso agora que talvez isso se deva ao facto dele viver de forma tão intensa o tempo e o espaço da memória, ao ponto de a tornar de novo presente, presença. Falou-se de tanta coisa em tão pouco tempo que parece que já estávamos a falar há anos (e talvez já tivéssemos mesmo tido esta conversa antes, mas se calhar esquecemo-nos dela nos entretantos do dia que se sucede ao dia seguinte sem nele se inscrever...) É preciso parar às vezes, olhar para a forma como fazemos as coisas, como tratamos as coisas. Procurar aquilo que foi sendo eliminado (e que cada vez mais tende a ser, neste circo mediático onde só desfilam carros de luxo e siglas que não compreendemos e nos envenenam a linguagem) - o tempo que já não existe. Deixar a imagem falar, ter o seu tempo e espaço, é um imenso desafio nesta era da imagem e dos simulacros dos simulacros dos simulacros. É também aqui que o meu olhar encontram o trabalho do Valter: na inscrição do tempo que não se inscreveu. Depois do medo de existir.

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